Itamar Franco relançou o Fusca para facilitar acesso ao carro popular
Falecido em 03/07, aos 81 anos, ex-presidente Itamar Franco tem uma página na história do automóvel no Brasil: foi o responsável pela volta do Volkswagen Fusca à linha de produção.
Em 1992, o Brasil vivia uma época de recuperação política e econômica. O Governo do presidente Collor havia liberado as importações de carros, pois ele era ácido nas críticas aos veículos produzidos pela indústria nacional, a qual se referia como carroças. Pouco depois veio o impeachment e o então vice-presidente Itamar Franco assumira interinamente a presidência, até 1995.
Itamar buscava algo que marcasse sua passagem pelo Planalto e foi achar a saída logo no Salão do Automóvel de São Paulo de 92, poucos dias após sua posse como presidente, em 2 de outubro, uma de suas primeiras aparições públicas. Na mostra automotiva, Itamar ficou inconformado ao perceber que o veículo mais barato em exposição custava o equivalente a US$ 23 mil. Nascia ali a ideia da marca do Governo Itamar Franco: um carro popular, que pudesse ser adquirido pela classe média, tão popular quanto o Fusca, que havia deixado de ser produzido no Brasil em 1986.
O então presidente chegou a citar em suas entrevistas a necessidade de um carro para o povo e apelou para que a Volkswagen voltasse a fabricar o Fusca. Outra versão da história da volta do Fusca na era Itamar é de que o político queria apenas agradar sua ex-namorada Lislie, que possuía um exemplar 1981. Outra versão conta que seria apenas um capricho pessoal de Itamar, que na impossibilidade de comprar um Fusca, pediu à Volks que voltasse a fabricar o 'Besouro'.
Mas nenhuma dessas histórias se confirmaram e a verdade veio à tona em 25 de janeiro de 1993. Como a Volkswagen não havia esboçado nenhuma reação às entrevistas, Itamar convidou o presidente da Autolatina, Pierre-Alain de Smedt, para uma reunião em Brasília. Bastou apenas uma conversa para que ele deixasse a capital federal com o acordo da volta do Fusca ao mercado nacional
Início dos carros populares
Em 04 de fevereiro do mesmo ano, o protocolo do carro popular foi assinado. Para veículos dessa nova categoria seria cobrado o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de apenas 0,1%. Esses automóveis seriam obrigatoriamente equipados com motor 1.0 litro e preço ao consumidor de no máximo US$ 6,8 mil. Com o Protocolo de Intenções firmado com o Governo Federal, a Autolatina investiu US$ 30 milhões e proporcionou a geração de 800 novos empregos. Anos antes, a Fiat já havia conseguido um desconto no IPI para o Uno Mille, não tão atraente quanto ao que previa o protocolo do carro popular, mas era o único no mercado com esse diferencial, que conquistava o consumidor pelo preço. Como o Fusca só tinha motor 1.6, foi preciso criar uma brecha para incluí-lo no benefício: o limite do motor de mil cilindradas era válido somente para motor refrigerado a água. A VW aproveitou a boa ideia do governo e colocou a Kombi no mesmo 'pacote', assim, o utilitário também passou a ter status de carro popular, como o Fusca.
Na imprensa e na própria Volkswagen, poucos davam credibilidade ao retorno do Fusca. Assim que a volta do modelo foi anunciada, a mídia alfinetou, dizendo que o carro era ultrapassado, inseguro e incompatível para aquele momento, em que o Brasil já recebia os carros mais modernos do mundo por causa da liberação para a entrada dos importados desde o Governo Collor. A matriz da Volkswagen, na Alemanha, também não viu com bons olhos e considerou a volta do Fusca apenas uma edição especial. A sede brasileira tratava o assunto como uma sugestão do presidente Itamar Franco.
O prazo para a volta do Fusca ao mercado era curto e o departamento de engenharia da Volks do Brasil tinha o desafio de reativar uma linha de montagem extinta sete anos antes. Muitos dos maquinários usados para fazer o Fusca no Brasil em sua primeira fase (1959 até 1986) já haviam sido vendidos pela VW aos fabricantes de peças de reposição do modelo. A saída foi comprar as partes do modelo deses fabricantes. Espaço não era problema, pois a fábrica de Anchieta comportava tranquilamente a linha do Fusca, que não necessitava de solda em sua construção. As modificações mecânicas do 'Fusca Itamar' se resumiam na adição do catalisador e do alternador. Para testar essas mudanças, a Volkswagen simplesmente comprou Fuscas usados em bom estado de conservação para serem usados como mulas.
Em 23 de agosto de 1993, Itamar Franco reinaugurou a linha de montagem do Fusca na fábrica de Anchieta, da Volkswagen. Na cerimônia, Itamar usou um Fusca conversível, feito especialmente para a ocasião. Na unidade fabril eram montados 100 Fuscas por dia.
Desafio para o marketing
O Fusca ressuscitado viveu por mais três anos. No início, em 1993, a Volkswagen anunciou que a fila de espera era de 13 mil interessados, entre eles nomes conhecidos como o jogador Palinha, na época meia-atacante do São Paulo, vivendo sua melhor fase, quando conquistou a Libertadores e o Mundial pelo tricolor paulista. A lista das personalidades que queriam o Fusca – mesmo com o poder aquisitivo de ter carros de luxo - incluía ainda o músico Geraldo Vandré, o publicitário Alex Periscinoto, o Arcebispo Dom Aloísio Lorscheider, o nobre Afonso de Orleans e Bragança, e o então ministro da justiça Maurício Corrêa.
A montadora usou essa lista de 'famosos' para proteger o Fusca dos ataques da imprensa, e deu certo. Porém, apesar do sucesso na estreia, o Fusca começou a encalhar nas concessionárias meses depois, fazendo a Volks a canalizar a distribuição do modelo para as revendas de cidades do interior e para frotistas, pois nas grandes capitais, os consumidores preferiam o Gol 1000 e Fiat Uno Mille. Custando CR$ 700 mil, o Fusca era um dos carros mais baratos do mercado na época, vendendo cerca de 1,5 mil unidades em média por mês no primeiro ano.
As vendas do Fusca Itamar só despencavam pelo fato de ter o preço muito próximo de carros mais evoluídos. Em 1996, Itamar Franco já não era mais presidente, o plano real, criado por ele, já completava dois anos e o Fusca, ainda em linha, tentava sobreviver no mercado pelo preço de R$ 8,7 mil, bem próximo do Gol 1000, vendido por R$ 9,5 mil, do Gol 1.0 segunda geração R$ 11,3 mil e do Fiat Mille EP a R$ 11 mil. Ainda entre os populares, nascia o Fiat Palio, referência em tecnologia entre os compactos na segunda metade da década de 1990.
Em 28 de junho de 1996, o Fusca sai de linha no Brasil, de forma discreta, deixando a comemoração por conta apenas da série Ouro para as últimas 1,5 mil unidades. A edição de despedida do Besouro trazia o revestimento interno esportivo usado no Pointer Gti, novos mostradores de fundo branco, faróis de neblina e lanternas traseiras fumê. Nos três anos de vida do Fusca Itamar, foram produzidas pouco mais de 46 mil unidades.
O Fusca usado por Itamar na reinauguração da linha de montagem do modelo foi doado a ele e hoje se encontra no memorial do ex-presidente, em Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira.
Fonte: http://www.estadodeminas.vrum.com.br/
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