terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Rádio Digital no Brasil

Prof. Álvaro Bufarah*
Rádio Agência Nos últimos anos criou-se uma panacéia sobre a instalação do Rádio Digital no Brasil. Nela, todos os problemas seriam solucionados com a troca do sistema por uma das linguagens em utilização do planeta. Porém, alguns itens precisam ser levantados sobre este processo:
- a) Quando falamos de digitalização, estamos na realidade nos referindo à transmissão entre a emissora e o receptor em formato digital. Embora pareça óbvio, algumas emissoras tendem a afirmar que são "a primeira digital do país", "a única rádio digital". Na realidade, a digitalização dos conteúdos teve início nos anos 90 com a chegado dos CDs, MDs, DATs, etc. O resto é marketing para tentar enrolar o ouvinte. Até agora, as transmissões em padrão digital não saíram do formato de teste.
-b) Temos quatro formatos disponíveis: Iboc (norte-americano), DAB e DRM (europeus) e o ISDB (japonês) cada um com suas características, com pontos positivos e negativos para a instalação no Brasil. Entre elas, o que mais pesa é a necessidade de troca de transmissores e receptores em curto espaço de tempo caso forem aderidos os três últimos formatos. Porém, o padrão americano é uma tecnologia patente na qual teríamos de pagar royalties e ainda não temos testes suficientes para a aceitação homogênea no mercado brasileiro.
- c) Rádio via satélite: já está em fase comercial o uso de transmissões via satélite para receptores cujo proprietário paga uma assinatura para acessar o sistema. Nesse formato, o usuário tem disponível até 150 canais de áudio com uma vasta quantidade de perfis. O uso dessa tecnologia no Brasil ainda é muito cara, pois necessita de uma rede de satélites de baixa órbita. Este formato está em uso nos Estados Unidos, parte da Europa da Ásia e Oriente Médio com boa aceitação pelo público.
- d) Celulares: no Brasil, o uso de celulares cresce generosamente a cada ano, sendo uma plataforma interessante para a veiculação de conteúdos sonoros. Porém, poucas emissoras e operadoras estão investindo em testes nesse setor. Por isso, o uso ainda é restrito e o custo para o usuário é alto se comparado aos seus benefícios e ao uso de um receptor portátil convencional.
- e) TV por assinatura: temos já disponível no país a possibilidade de enviarmos sinais de áudio no mesmo sistema de TV por assinatura (seja cabo, satélite,etc). Porém, poucas emissoras estão utilizando este sistema. Também devemos levar em consideração que o público de rádio não está habituado a ligar a TV para ouvir o áudio de sua emissora preferida. Mas o conteúdo dessas emissoras também é exatamente igual ao já veiculado tradicionalmente. Com isso, não há estímulo para o usuário.
- f) Rádio na Internet: embora tenhamos um crescimento exponencial do número de emissoras de internet a qualidade do conteúdo e a variação em relação aos meios tradicionais ainda são poucas se comparadas às possibilidades. Uma emissora web pode e deve experimentar a transmissão de eventos diferenciados, promoções com perfis absolutamente inovadores,etc. Com a tendência de acesso rápido sem fio nas grandes cidades brasileiras, as emissoras on-line podem se valer de seus nichos para aumentarem suas audiências.
- g) Podcast: a possibilidade de baixar arquivos da rede para players portáteis está crescendo diariamente, mesmo para as camadas mais baixas da sociedade. Um jovem pode levar seu tocador de baixo custo (entre R$ 30,00 e R$ 50,00 nas ruas de uma cidade como São Paulo) até uma Lan house e baixar os conteúdos que preferir. Com isso, ele deixa de ouvir o rádio convencional para acessar uma lista de seus arquivos. Poucas emissoras de rádio brasileiras conseguiram estreitar este caminho possibilitando que seus ouvintes possam ser usuários de suas programações.
- h) Interatividade: segundo os teóricos, temos vários níveis de interatividade, mas o fundamental é que o ouvinte possa se sentir parte integrante do processo de decisão dos conteúdos que serão veiculados. Para que isso ocorra, a gestão das emissoras precisa pensar nesses conteúdos como produtos bidirecionais (onde o ouvinte participa ativamente da produção). Infelizmente, poucas emissoras conseguiram esta façanha, pois boa parte das decisões está nas mãos de poucos profissionais que ainda visualizam suas funções de forma analógica (autoritária) diante de um mercado digital (colaborativo).
- i) Convivência entre os públicos: mesmo com todas estas novas formas de acesso e com os novos perfis de públicos, ainda temos o público padrão que só quer ouvir a programação em seu rádio de pilhas. Isso não significa que temos de abandoná-lo, mas temos de lidar com estes diversos públicos, atendendo a cada um deles, embora isso signifique mais custo, o que na realidade, é um investimento na fidelização destes ouvintes.
- j) Impasse político: no caso brasileiro, há ainda um impasse do governo em decidir por uma tecnologia de rádio digital. De tal forma que perdemos o momento para esta tecnologia. Mesmo que decidamos por um dos formatos atualmente, o custo de implantação para o mercado brasileiro diante das novas plataformas (internet, celular,etc) torna o rádio digital um "brinquedo caro" para as empresas.
- k) Problemas de gestão nas emissoras: as empresas de radiodifusão brasileiras, com poucas e honrosas exceções, são mal gerenciadas. A situação clássica é que alguém da área de administração ou marketing assume a gestão da emissora, porém, desconhece a linguagem e as características do meio radiofônico. Por outro lado, alguém da área de produção assume a gestão, embora saiba sobre o meio e o formato da mensagem, desconhece as formas de administração mais modernas. Com isso, criamos um cabo de guerra em que a gestão raramente consegue integrar produção e administração sob o mesmo comando. Com isso, temos boas idéias sem futuro e um futuro sem idéias...
- l) Pesquisa e aferição: não menos importante é falar sobre a necessidade de pesquisas sobre a audiência e a aferição correta da veiculação dos espaços comerciais. Embora o mercado de rádio tenha melhorado muito, ainda temos "picaretas" que vendem, mas não entregam o que foi contratado pelo anunciante. Além disso, temos em todos os mercados de rádio do país várias emissoras que se "dizem" primeiro lugar, mesmo que tenhamos que ler a tabela de baixo para cima para encontrá-la no ranking. Esta ausência de seriedade causa um hiato de credibilidade no setor, de tal forma que acabamos com a menor fatia do bolo publicitário. Quero encerrar esta lista de ponderações com uma característica fundamental do rádio brasileiro: sempre fomos muito criativos. Mas nos últimos anos, estamos investindo mais em tecnologia do que em pessoal. Com isso, temos uma defasagem "humana" na linguagem do meio. Nossos produtos são excessivamente clean,(limpos de ruídos), com sons assépticos, mas com mensagens vazias. Não estou fazendo apologia ao rádio com chiado ou as velhas narrativas alongadas. Mas sim, defendo um rádio mais autoral. Um rádio com cara de rádio! Sugiro recriarmos o rádio com base nas novas tecnologias, mas não esqueçamos "o que é rádio". Quem sabe não deveríamos seguir em busca do elo perdido da criatividade das programações do rádio brasileiro?
Dica de livro: Para os amantes do rádio uma boa sugestão de leitura é o livro "Gestão e Mediações nas Rádios Comunitárias - um panorama do estado de Santa Catarina", da Argos Editora Universitária de Terezinha Silva.
O livro é resultado de uma extensa pesquisa que vai além do pieguismo ideológico da defesa ou do conservadorismo autocrata do enfrentamento. Embora o teor do trabalho seja focado no estado de Santa Catarina, a discussão transcende as linhas geográficas e chega a questões políticas, econômicas e sociais que raramente são debatidas com seriedade em nosso país.
*Prof. Álvaro Bufarah é Jornalista, especialista em política internacional, mestre e pesquisador sobre rádio. Coordenador da Pós-Graduação em Produção e Gestão Execu.

Um comentário:

Filipe Araújo disse...

Gostaria que desse a possibilidade de sintonizarmos rádios de outros países do mundo. É querer demais, né!? jajaj...nosso dial mau mau comporta nossa rádios...

Saludos!

http://gambetas.blogspot.com