segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Literatura

OPULÊNCIA E FALÊNCIA DA MANCHETE
Roberto Porto*
Estão desembarcando nas livrarias dois livros interessantes sobre a vida e a obra de Adolpho Bloch (1908-1995), empresário ucraniano que criou a revista Manchete em 1952, que foi à falência em 2005.
- O primeiro é ‘Aconteceu na Manchete – As histórias que ninguém contou’, de José Esmeraldo Gonçalves,
- o outro, mais profundo, é ‘Os irmãos Karamabloch – Ascensão e queda de um império familiar’, de Arnaldo Bloch. O nome Karamabloch, justiça seja feita, surgiu da imaginação fértil de Oto Lara Rezende (1922-1992), que trabalhou em Bloch Editores, a convite de Adolpho Bloch, e conheceu intimidades da empresa que me abrigou, como simples redator de várias revistas no período 1969-1974.
Pessoalmente, não posso, por razões óbvias – distanciamento da direção da casa – fazer um julgamento a respeito da falência da empresa. Como quase todos que lá trabalharam, por anos a fio, atribuo o desastre com o desejo de Adolpho Bloch criar a TV Manchete e competir com a TV Globo, que já navegava em águas tranqüilas depois de um primeiro estágio turbulento, após sua inauguração em 1965.
Mas nos seis anos em que trabalhei na espetacular sede da Rua do Russel, presenciei cenas as mais incríveis. Bem me recordo de uma delas, no sétimo andar do prédio, na redação vazia de Pais & Filhos. Era hora do almoço e uma repórter, com a saia curta da época, olhava placidamente para o belo cenário da Guanabara que se vislumbrava de lá.
Adolpho passou pelo corredor, deu uma meia trava e perguntou a um de seus comandados mais diretos (talvez Jaquito): - Quem é aquela garota de saia curta que está na janela? - É uma repórter de Pais & Filhos – respondeu o interlocutor. De imediato, Adolpho decretou a sentença: - Demita ela, demita ela...Está usando saia muito curta... Não preciso dizer que Moacir Japiassu, subeditor de Pais & Filhos, foi obrigado a cumprir a absurda e reacionária ordem de Adolpho Bloch.
Em outra ocasião, por volta de 1973, durante as intermináveis guerras entre árabes e israelenses, pelo vidro do corredor do oitavo andar surpreendi Adolpho Bloch manipulando incontáveis barras de ouro e as acomodando numa mala, após negociá-las com um homem de preto, um judeu nitidamente ortodoxo. Fiquei simplesmente abestalhado. Nunca vira tanto ouro em barras e confesso que até hoje só em filmes voltei a vê-las. Me disseram depois – não posso garantir se a história é verdadeira – que Zevi Ghivelder, jornalista que trabalhava conosco, iria saltar de pára-quedas atrás das linhas israelenses e, com todo aquele ouro, ajudar a manutenção da integridade do estado de Israel.
Por todas essas loucuras – quase fui vítima de uma delas, mas Jaquito me livrou – acredito que o ouro despejado na TV Manchete – inclusive com a construção de um novo edifício igualzinho ao primeiro – ajudou a quebrar uma empresa que aparentava uma solidez inacreditável, principalmente após a construção de Brasília, esparramada nas páginas da Manchete e retribuída em créditos oficiais e volumosos pelo então presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira.
Terá sido por isso que o velório de Juscelino, em 1976, ocorreu no hall de entrada da Manchete? Não sei. Talvez os leitores do Direto da Redação descubram lendo os dois livros que estão chegando às livrarias.
*Roberto Porto é Jornalista

Um comentário:

Zé Dudu disse...

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