quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Santo Amaro-SP

Santo Amaro, um Município engolido pela Metrópole Paulistana

A Povoação começou por um aldeamento de indígenas guayanazes, com a denominação de Ibirapoera, sob a direção do venerável padre José de Anchieta, pelos annos de 1560 e seguintes. A Capella foi erigida sob a invocação de Santo Amaro, por João Paes e sua mulher Suzanna Rodrigues, naturaes de Portugal, que tinham vindo para São Vicente com o donatário Martim Affonso de Souza.

Para a nova povoação começaram a affluir moradores, que conseguiram a creação da parochia, por provisão do bispo Dom José de Barros e Alarcão, de 14 de Janeiro de 1686. Do auto lançado no primeiro livro do tombo, em 30 de Junho de 1747, de ordem do primeiro bispo desta archidiocese Dom Bernardo Rodrigues Nogueira, consta que a igreja teve princípio em 1686, sendo nomeado pela provisão citada, vigário ou capellão cura o padre João de Pontes, imrão do venerando padre Belchior de Pontes, o que deixa evidente que antes dessa época já existia no logar uma igreja. Foi elevada a villa por decreto de 10 de Julho de 1832.

Fundação
Após a fundação da vila de São Paulo, em 1554, os jesuítas foram distribuídos na Capitania de São Vicente em três locais, conforme determinado pelo Padre Manuel da Nóbrega, Provincial dos Jesuítas: São Vicente; São Paulo e Jeribatiba (Santo Amaro), locais onde os jesuítas realizavam trabalhos de catequese e educação de crianças índias e mamelucas. José de Anchieta vindo do povoado de São Paulo de Piratininga (São Paulo), em uma das várias vezes que visitou a Aldeia de Jeribatiba percebeu que devido ao número de índios catequizados e colonos instalados na região, era possível constituir ali um povoado, idéia aprovada pelos moradores. Para esse fim foi construída uma capela, em terras da região do Cupecê onde moravam João Pais e sua esposa Susana Rodrigues, que doaram a imagem de Santo Amaro (imagem até hoje preservada) para a capela organizada por Anchieta, “feita de taipa de pilão, não forrada”, e qual foi transformada em freguesia (distrito) em 1686.

Alemães
No final do Primeiro Reinado, por ocasião do casamento de Dom Pedro I com Dona Amélia de Leuchtenberg, o primeiro grupo de colonos alemães veio se juntar ao povoamento daquela região. Data dessa época de pioneiros o Cemitério da Colônia (alemã), em Parelheiros. No final do século XIX e início do século XX, novos grupos de alemães, e também de escandinavos, dirigiram-se à região de Santo Amaro, estabelecendo-se preferentemente no bairro do Alto da Boa Vista, ao qual deram uma característica própria que persiste até os dias de hoje.

Município
Em 1832 Santo Amaro torna-se município, separado de São Paulo, sendo instalado em 7 de abril de 1833. O município abrangia todo o território que se situava ao sul do antigo Córrego da Traição, hoje em dia canalizado e sobre o qual existe a Avenida dos Bandeirantes, estendendo-se até a Serra do Mar. Incluía, na sua formação, também as áreas que hoje correspondem aos municípios de Itapecerica da Serra, Embu, Embu-Guaçu, Taboão da Serra, São Lourenço da Serra e Juquitiba, que se separaram em 1877 para a formação do município de Itapecerica da Serra.

Em 1886 foi inagurada a linha férrea de São Paulo a Santo Amaro, com a presença do Imperador Dom Pedro II. A antiga linha seguia desde pelo que hoje corresponde à Avenida da Liberdade, Rua Vergueiro, Rua Domingos de Morais e Avenida Jabaquara (o trajeto da atual Linha 1 do metrô), passando por trás de onde, mais tarde, seria construído o Aeroporto de Congonhas, e daí seguia até Santo Amaro.

Cabe mencionar que a autorização para a construção dessa linha férrea, conforme a Lei Provincial número 56, de 11 de maio de 1877, previa que ela fizesse a ligação entre São Paulo e o povoado de São Lourenço (atual município de São Lourenço da Serra).

Essa linha de trens foi substituída, em 7 de julho de 1913, por uma linha de bondes, que do trajeto anterior desviava na Rua Domingos de Morais para a Avenida Conselheiro Rodrigues Alves, seguindo pelas regiões de Indianópolis, Campo Belo, Brooklin Paulista e Alto da Boa Vista, dando origem ao que hoje são a Avenida Ibirapuera e a Avenida Vereador José Diniz.

Em 1899 foi inagurada a Santa Casa de Misericórdia de Santo Amaro, e em 1924 a igreja Matriz de Santo Amaro (atual Catedral de Santo Amaro, pois em 27 de maio de 1989 o Papa João Paulo II criou a Diocese de Santo Amaro, desmembrando a região da Arquidiocese de São Paulo).

A inaguração do Aeroporto de Congonhas, em 1934, foi uma das razões pelas quais o decreto estadual número 6983, de 22 de fevereiro de 1935, determinou a extinção do município de Santo Amaro, incorporando-o ao município de São Paulo. (Durante a Revolução Constitucionalista de 1932, o Campo de Marte foi ocupado pelas tropas rebeldes, o que levou o Governo de Getúlio Vargas a procurar locais alternativos para o transporte aéreo em São Paulo.)

A área do antigo município foi então subdividida nos subdistritos de Santo Amaro, Ibirapuera, Capela do Socorro, e no distrito de Parelheiros.

Movimentos emancipacionistas ocorridos nas décadas de 1950 e 1970, contudo, não conseguiram sensibilizar a população para que Santo Amaro fosse novamente elevado à condição de município.

Sobre os Limites do Município:
(Alguns equívocos históricos existem sobre os limites do Município de Santo Amaro, que descrevo aqui, da forma oficial de 1925)

Divisas:
O Município de Santo Amaro foi creado pelo decreto de 10 de Julho de 1832.

Do Relatório do Dr.Nabuco de Araújo, 1852, conta que o município de Santo Amaro tem divisas incontestadas: Com a Freguesia da Sé, pelo Ribeirão da Traição acima, desde o ponto em que atravessa a estrada até as suas primeiras vertentes e dahi seguindo até chegar a Cruz das Almas, na estrada dos carros (Nota minha: Cruz das Almas - Sta.Cruz/Vila Mariana - Estrada dos Carros - Caminho do Carro para Santo Amaro, antigo trecho do Peabiru, atual Av.Domingos de Moraes), a buscar o sítio do Capitão André Cursino, e dahi a rumo do Sul, pela estrada que vae ao Curral Grande, sítio de Antônio de Medeiros, seguindo a Estrada dos Carros até a encruzilhada do Pinhahiba, onde se toca com a recta que, seguindo pelo Morro Vermelho, divide a Sé da Freguezia de São Bernardo. (Pinhahiba ou Pinhaíba - Região compreendida atualmente pelo Taboão de São Bernardo do Campo, e pelo Zoológico/Simba Safari ou Zoo Safari - Curral Grande e Curral Pequeno, regiões compreendidas pelos Altos da Avenida do Cursino e pela região da Av.Padre Arlindo Vieira - antiga Estrada do Curral Pequeno. O Tal Morro Vermelho, faz parte de São Paulo hoje, e está próximo ao Carrefour Anchieta)

Com São Bernardo divide-se caminhando pela Estrada do Guacury (Guacuri, atual Diadema - porção central), na ponte e córrego, a dar no Rio Juribatuva (Rio Jurubatuba, ou Geribatiba ou Juribatuva), e por elle a dar no Rio Grande, onde faz barra o Rio Pequeno, e dahi em linha recta, á Serra do Mar. (Rio Grande e Rio Pequeno atualmente represados formam a Represa Billings juntamente com outros rios)

Com Santa Ephigenia e Cotia, pelo Ribeirão da Traição abaixo até fazer barra com o Rio dos Pinheiros e atravessando este a rumo direito a procurar a encruzilhada do caminho que vae da Cidade de São Paulo a MBoy, até encontrar o rio MBoy Mirim. (Mboy - Rio das Cobras - a referida no texto é a atual Embu-Guaçu - Embu é corruptela de Mboy)

Com Itapecerica, (separou-se em 1877) seguindo da ponte que fica no caminho mencionado, rio abaixo até outra ponte do Mboy Mirim , no caminho de Bongassu, e por elle a ponte do Jasseguava e desta ponte, rio acima, até as suas nascentes, e dahi, em linha recta, até a Serra do Mar, pertencendo a Santo Amaro os moradores que lhe ficam aquem da serra." (Bongassu e Jasseguava - atual Jaceguava - são partes dos limites atuais entre Embu-Guaçu e São Paulo na altura de Parelheiros)

Essas são as divisas originais do Município de Santo Amaro, que em anos seguintes, através de decretos provinciais, vai sendo ligeiramente alterada, alterações insignificantes - e longas demais, além de enfadonhas, para quem não é "maluco" pelo assunto.

Símbolos Municipais:
Affonso D´Escragnole Taunay criou o brasão do município com os dizeres “Antiquissimum Genus Paulista Meum” (pertenço à mais velha sociedade paulista).
O Brasão com os dizeres e uma alegoria relativa ao Município estão estampados em um monumento, na praça onde está a estátua de Borba Gato.

Porque Santo Amaro deixou de ser um Município para ser anexada a São Paulo?

Os Motivos são vários, para começar pelo oficial, vamos ao decreto que rebaixou o Município a condição de Distrito:

Decreto Nº 5.983 de 22 de fevereiro de 1935 
O Doutor Armando de Salles Oliveira, Interventor Federal no Estado de São Paulo usando das atribuições que lhe são conferidas pelo decreto federal nº 19.398 de 11 de novembro de 1930,

Considerando que dentro do plano geral de urbanismo da cidade de São Paulo, o município de Santo Amaro está destinado a construir um dos seus mais atraentes centros de recreio;

Considerando que para a organização desse plano o Estado tem que auxiliar, diretamente ou por ato da Prefeitura, as finanças de Santo Amaro, tanto que desde já declara extinta sua responsabilidade para com o Tesouro do Estado, proveniente do contrato de 18 de julho de 1931, e que muito onera o seu orçamento e dificulta a sua expansão econômica e cultural;

Considerando que, liquidada essa dívida todas as suas rendas poderão ser aplicadas no seu próprio desenvolvimento;

Considerando ainda que o Estado não só se dispõe a incrementar em Santo Amaro, a construção de hotéis e estabelecimentos balneários que permitam o funcionamento de cassinos, com também já destinou verba para melhorar as estradas de rodagem que servem aquela localidade, facilitando-lhe todos os meios de comunicação, rápida e eficiente com o centro urbano;

Decreta:
Art. 1.º - fica extinto o município de Santo Amaro, cujo território passará a fazer parte do município da Capital, constituindo uma sub-prefeitura, diretamente subordinada à Prefeitura de São Paulo.

Art. 2º - O subprefeito será nomeado pelo Prefeito da Capital com os vencimentos anuais de 24:000$000 (vinte e quatro contos de réis);

Art. 3º - Serão mantidos os direitos dos atuais funcionários da Prefeitura de Santo Amaro, que poderão servir na sub-prefeitura ora, criada, ou ser reaproveitados na Prefeitura da Capital.

Art. 4º - Fica o Tesouro do Estado autorizado a cancelar o adiantamento de 500:000$000 (quinhentos contos de réis); atualmente acrescidos dos juros de 124:658$600 e que foi feito ao município de Santo Amaro em virtude do contrato de 18 de julho de 1931, abrindo-se para esse fim o necessário crédito.

Art. 5º - Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Palácio do Governo do Estado de São Paulo, aos 22 de fevereiro de 1935,

Pelo decreto oficial, constatou-se que Santo Amaro era um município vastíssimo, que não conseguia se auto-sustentar, devia 500 contos ao tesouro do Estado de São Paulo, e por isso tornou-se um distrito da Capital. No entanto, existem várias especulações sobre o fim do município, cito algumas:

- Construção do Aeroporto de Congonhas: Durante a Revolução de 1932, o Campo de Marte foi rapidamente dominado pelos revoltosos paulistas, além disso, o local costumava ficar alagado durante as cheias do Rio Tietê. Não faria sentido na época o Aeroporto de São Paulo estar em outro Município senão a própria Capital, argumento pouco convincente, já que para isso poderiam ter excluído apenas uma pequena parte do antigo município.

- Vingança de Getúlio Vargas: Que Getúlio é uma figura não muito adorada em São Paulo, todos sabem, mas alguns insistem que Santo Amaro perdeu o posto de município por conta da má vontade do ex-presidente com São Paulo. Em 10 de Julho de 1932, Santo Amaro comemoraria seu primeiro centenário como município autônomo, e uma grande comemoração estava sendo realizada. A Comemoração foi totalmente paralizada e abandonada quando a revolução estourou, e em Santo Amaro foi formado um dos primeiros batalhões Paulistas, a “Companhia Isolada de Santo Amaro”. Outro argumento pouco convicente, afinal Santo Amaro era uma cidade vasta em território, mas fraca em termos econômicos e populacionais, e o rebaixamento só veio em 1935.

A Verdade é que Santo Amaro já possuía a Represa de Guarapiranga, de interesse vital para o Município de São Paulo, não era auto-sustentável, e polarizava grande parte das divisas com o turismo provindo da Capital, ás margens da já citada represa, os Paulistanos curtiam seus momentos de lazer.

E se Santo Amaro ainda fosse um Município independente?
- Teria cerca de 3 Milhões de Habitantes
- Figuraria entre os maiores municípios do Brasil
- Ponte Estaiada e Berrini seriam cartões postais de Santo Amaro
- Seria a única cidade do Estado fora da Capital a contar com uma linha de metrô (Linha 5 - Lilás)
- Seria o segundo maior município do Estado.
- Teria alguns dos mais nobres bairros de São Paulo
- Teria o aeroporto mais movimentado do Estado e do Brasil (Congonhas)
- São Paulo não faria limites com nenhum município litorâneo

Tudo isso é mera curiosidade, afinal, e Santo Amaro tivesse permanecido como Município independente, a configuração da Cidade de São Paulo mudaria radicalmente. Vale como curiosidade apenas.

Tentativas de Emancipação
Após o rebaixamento em 1935, surgiram alguns movimentos autonomistas em Santo Amaro, movimentos que perduram até hoje, mas de uma maneira bem tímida. Em 15 de Setembro de 1985, 60.383 Santoamarenses foram as urnas para votar em um plebiscito que previa a autonomia, no entanto, 56.232 rejeitaram a proposta. A Maioria dos habitantes do território do antigo município, nem desconfia que Santo Amaro já foi independente de São Paulo, e os movimentos foram ficando cada vez mais fracos. Hoje em dia, a conurbação e as relações com São Paulo são tão intensas, que é muito difícil notar que ali já foi um outro centro, uma outra cidade.

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