segunda-feira, 27 de junho de 2011

Villa Nova A.C. (Nova Lima)

por Wagner Augusto*

Um dos mais tradicionais clubes do futebol mineiro e brasileiro completa nesta terça-feira, 28 de junho, 103 de anos de fundação: o Villa Nova Atlético Clube, o bravo Leão do Bonfim, de Nova Lima.
Na era da globalização, em que os clubes que não são de massa estão cada dia mais fadados ao desaparecimento pela conjuntura histórica, e ao ostracismo pela imprensa esportiva, o Villa teima em sobreviver.
Para celebrar seu 103º aniversário, a diretoria do clube promoveu um baile no último sábado no Ginásio Poliesporivo. Na terça-feira, será celebrada uma missa em ação de graças na Igreja Matriz de Nossa Senhora Pilar, às 19h.
Segue abaixo um pouco da história do Villa Nova, que está contada em dois livros:
VILLA NOVA: 100 ANOS DE GLÓRIA EM VERMELHO E BRANCO(lançado em abril de 2008) e ALMANAQUE DO LEÃO DO BONFIM(lançado em abril de 2011).


A fundação do Villa Nova

A história do Villa Nova Atlético Clube, bem como a do Município de Nova Lima, está intrinsecamente ligada à exploração do ouro na região. A procura pelo valioso metal, segundo os registros históricos, começou por ali no final do século XVII, e a descoberta do Morro Velho, próximo ao Morro Novo e ao Morro do Mingu, local das primeiras minas, teria ocorrido por volta de 1725. O aparecimento dos investimentos ingleses na mineração do ouro em Nova Lima remonta ao longínquo ano de 1834, quando a mina foi adquirida pela Saint John Del Rey Mining Company Limited, que, numa tradução literal para o português significa Companhia de Mineração São João Del Rey Ltda. Os ingleses haviam comprado as minas de ouro do antigo proprietário, George Francis Lyon.
Em 1957, os ingleses começaram a fazer a transferência acionária da empresa para os brasileiros, e foi assim que em 1960 surgiu a Mineração Morro Velho. A busca por novas tecnologias que possibilitassem a extração do ouro localizado no subsolo (a mina de ouro de Morro Velho tinha galerias que avançam a 2.453 metros abaixo da superfície) fez com que a Morro Velho se associasse em 1975 à Anglo American Corporation, empresa sul-africana.

Atualmente, essa transnacional chama-se AngloGold Ashanti Brasil Mineração Ltda., que foi a patrocinadora master do Villa Nova de 2002 a 2010. A Mina Velha teve seus veios auríferos exauridos e foi fechada em 2003, não havendo desde então mais exploração de ouro no município. As demais minas de Nova Lima, embora fechadas temporariamente, não foram exauridas.
Desde os primórdios da presença inglesa em Nova Lima, é inegável que a influência exercida por seus representantes sempre marcou a trajetória socioeconômica do município de maneira decisiva. É natural que na primeira década do século XX os inúmeros mineradores e demais trabalhadores envolvidos nas atividades da Saint John Del Rey Mining Company Limited tivessem no futebol uma fonte de lazer. E foi nesse contexto que houve a decisão de se fundar um time de futebol, a que batizaram de Villa Nova Athletic Club, numa homenagem ao nome da cidade que, na época, era Villa Nova de Lima, com "l" duplo. A histórica Villa Nova de Lima se separou de Sabará em 1891 e alcançou a sua tão sonhada emancipação político-administrativa. Em 1923, o município recebeu o nome atual e definitivo de Nova Lima. O nome da agremiação foi aportuguesado pelas reformas estatutárias posteriores.
O sangue que corre nas veias do bravo e destemido Leão do Bonfim foi, no entanto, plasmado também por brasileiros, mais precisamente pelas mãos iluminadas de Álvaro Magalhães, que, num encontro casual com o inglês George Fellews numa mesa de bar, uniu-se a ele para fundar o Villa Nova Atlético Clube. Antes da criação do clube, já existia em Nova Lima o Morro Velho Athletic Club, este sim, um time formado exclusivamente por ingleses. Ocorre que o Morro Velho nem sempre conseguia formar duas equipes entre os seus associados para viabilizar a realização de um jogo de futebol. Álvaro Magalhães era um assíduo espectador dos treinos do Morro Velho e tinha dentro de si o desejo de aprender a praticar o esporte e disseminá-lo entre a comunidade da antiga Villa Nova de Lima.

Os anseios do brasileiro vieram a calhar para o inglês George Fellews, já que a existência de outra equipe pelas vizinhanças poderia, finalmente, acabar com o crônico problema da falta de adversários para o Morro Velho. Juntaram-se as duas expectativas e, entre um trago e outro, juntamente com um grupo de outras pessoas amantes do futebol, decidiu-se pela fundação de uma nova agremiação. A reunião que sacramentou o nascimento do clube aconteceu nas dependências da Câmara Municipal da antiga Villa Nova de Lima. Quem presidiu o histórico encontro foi Álvaro Edwards Ribeiro, e dele, além dos idealizadores Álvaro Magalhães e George Fellews, participaram também: Fernando Anacleto, Hary Lowse, Ignes Gent, Ricardo Protzner, Albert Clemence, Elógio Pimentel, João Luiz Morethzon, George Morgan, Francisco Pimentel, José Gustavo Dias, John Clemence, Willy William, Francisco Goulart, Eduardo Morgan, Mário Morgan, João Moreira, Fritz Protzner, Raymundo Rodrigues, Antônio Oliveira e Agostinho Rodrigues de Mello, o conhecido Gute Mello.

Essa comunhão de raças fica evidente também na formação dos primeiros times do Leão ao longo da história. Numa época em que o racismo ditava vários comportamentos sociais, o Villa nunca se importou em escalar atletas negros, sendo um dos pioneiros em Minas Gerais nessa importante demonstração de democracia. E pensar que certos clubes brasileiros proibiam a presença de jogadores negros em suas fileiras e alguns chegaram ao cúmulo de tentar "branquear" os mulatos com pó-de-arroz...
O primeiro presidente eleito do Villa Nova foi Adolfo Magalhães, que tinha como secretário José Furtado e como "capitão de futebol"—função equivalente hoje a diretor de futebol —, George Fellews. João Luiz Morethzon, um dos fundadores, era mesmo um desportista nato, pois além de atuar no Leão foi presidente do Atlético Mineiro em 1914. Gute Mello, que viria ser pai do presidente do clube, Oswaldo Mello, foi mecânico da mineradora durante 20 anos e faleceu em 1972, aos 82 anos de idade.
Assim nascia o glorioso Villa Nova, como uma das mais fortes expressões que a influência inglesa legou para toda a região. Numa feliz coincidência, a agremiação foi criada um dia após vir à luz em Cordisburgo o grande escritor mineiro Guimarães Rosa. Fundado em 28 de junho de 1908, um sábado, pelos operários que labutavam na desvairada busca do ouro para a Saint John Del Rey Mining Company Limited e pela vontade de brasileiros de aprender a jogar futebol, o Villa Nova Atlético Clube é o segundo clube mais antigo de Minas Gerais em atividade, sendo superado apenas pelo Atlético, que nasceu em 25 de março de 1908, apenas três meses antes.

Como ocorreu com vários clubes brasileiros, senão com todos, o início da vida do Leão foi muito difícil, pois os dirigentes da mineradora ainda não haviam encampado a idéia da criação de um time futebol. O apoio da empresa viria um pouco mais tarde e de maneira efetiva, o que contribuiu decisivamente para que o Villa Nova fosse uma das grandes forças do futebol mineiro na primeira metade do século passado.
No começo da sua existência, o clube era bancado pelos próprios jogadores, e os treinos eram realizados num precário campo de terra, imóvel de propriedade da mineradora, localizado nas proximidades do antigo matadouro de Nova Lima. Quando a direção da Saint John Del Rey Mining Company Limited resolveu adotar e subvencionar o clube, este terreno no Bairro Bonfim foi cedido, e lá foi construído o Estádio Castor Cifuentes, que veio a receber várias transformações no transcurso do tempo.
Nessa época, o Villa Nova jogava com uniforme diferente do modelo que se imporia futuramente como o oficial e tradicional. Os calções, na verdade bermudas que cobriam o joelho, eram brancos, e as camisas brancas com uma faixa diagonal vermelha, cor escolhida para homenagear o padroeiro da Inglaterra, São Jorge.

Principais títulos conquistados
Campeão Brasileiro da Série B – 1971
Campeão Mineiro – 1932, 1933, 1934, 1935 e 1951
Campeão da Zona Centro do Torneio Centro-Sul – 1968
Campeão da Copa Centro da FMF – 1974
Campeão da Taça Minas Gerais – 1977 e 2006
Campeão Mineiro do Módulo II – 1995
Campeão Mineiro de Júnior – 1997 e 1998
Campeão Mineiro de Juvenil – 1964
Campeão da Copa Integração Júnior – 2005, 2008 e 2011.

A alma dos times que não são de massa
Sempre leio companheiros de torcida indagarem sobre o tamanho da "massa" de villa-novenses de coração. Não é uma questão que incomode ao ponto de me chatear em reconhecer a realidade, mas aborrece essa tentativa de mensuração. Temos torcida, é fato. Não quero saber se são 100.000 ou 10.000. Basta saber que o Villa Nova Atlético Clube nunca jogará sem fiéis.
Mas, como proveta de jornalista que sou, gosto de analisar. Em Comunicação de Massa, na Faculdade, estudei Guy Debord, autor de A Sociedade do Espetáculo. Leitura difícil, porém interessante... Com atenção, dá para tirar belas deduções para a vida, não só acadêmica.

Assim o faço: o Villa Nova existe?
Para quem não é Villa, não. O Villa não entra na mídia massiva. Para que o clube "fosse" verdade, ele teria que ser noticiado regularmente nos veículos de grande alcance midiático. O Villa Nova não é legitimado. O interesse no centenário clube alvirrubro se restringe basicamente aos seus fanáticos torcedores. Isso não é um problema villa-novense somente. E não só no futebol que acontece isso... Mas pego o exemplo do esporte! O Flamengo é notícia. Sempre será. A mídia massiva sempre terá no Flamengo um alcance a maiores públicos. Isso acaba se refletindo no tamanho de sua torcida, que vê seu clube legitimado. Seu clube existe, para flamenguistas e não-flamenguistas. E é [im]posto nas rodas de discussão. A mídia quase nos impõe: discutam sobre o Flamengo.

Exemplo esdrúxulo: o Flamengo seria o Banco Central; o Villa, a padaria do Manolo. Um assalto ao Banco Central tem mais relevância para um maior público. Um assalto à padaria do Manolo só importaria ao Seu Manolo, claro, seus funcionários e seus clientes. O assalto na padaria não seria notícia no meio massivo. Logo não existiria. A mídia entraria como selo de veracidade.
Eu, como torcedor do Leão do Bonfim que sou, pouco me importo com o Banco Central. Mas serei quase que obrigado a ter conhecimento sobre o fato, já que a mídia gorda me agendaria.
Em nada desmereço meu time o comparando a uma padaria. Só reflito sobre uma realidade. E aprendi a duvidar da legitimação midiática. Não podemos ser reféns de alguns meios. E na torcida do Villa Nova, existem muitas "viúvas".
Que se dane Debord! O Leão está em mim.
*Wagner Augusto é torcedor do Villa Nova

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