quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Literatura

Livro de 1975 que contesta o mito de Pelé permanece no limbo da história

'A Verdade Sobre Pelé', do jornalista santista Adriano Neiva da Motta e Silva, o De Vaney, foi recolhido 15 dias após ter sido lançado e virou raridade bibliográfica

Gênio, rei, mito, deus...Não há um adjetivo que já não tenha sido utilizado para qualificar Pelé. Sua imagem vende tudo. Seu rosto transmite credibilidade. Mas o craque não é unanimidade e Maradona não foi o único a questionar a majestade do Rei do Futebol. Adriano Neiva, o De Vaney, jornalista santista que acompanhou de perto toda a carreira de Pelé, ousou atacar o mito. E pagou por isso.

Em 1975, ele lançou um livro cujo título resume bem suas intenções: “A Verdade sobre Pelé: as fantasias, os exageros, o mito e a história de um desertor”. De Vaney ainda estava engasgado com o fato de o craque ter se recusado a disputar a Copa de 1974 e resolveu abrir seu arquivo para levantar dados estatísticos e históricos na tentativa de provar que Pelé, além de grande jogador, também era produto de marketing.

“Pelé teria feito jus ao culto, ao fanatismo, à religião da qual se tornou símbolo, imagem e deus? Essa indagação tem resposta neste livro, cujo objetivo é o de preservar a história do futebol brasileiro das deturpações originárias da vertiginosa e comercializada ampliação do mito”. Este é o texto do curto, mas bombástico prefácio.

O livro começou a ser vendido em bancas, mas foi recolhido em duas semanas. Ninguém jamais explicou ao autor o motivo do sumiço. Hoje, a obra é raríssima. O jornalista morreu em 1990 sem ver seu livro ser conhecido e discutido

De Vaney ouviu muitos xingamentos nas ruas logo após o lançamento. Na ocasião, o jornalista trabalhava para o jornal "Cidade de Santos" e era correspondente de vários outros periódicos. Houve até ameaças de agências de publicidade, que prometiam cancelar anúncios em veículos para os quais De Vaney prestasse serviços.

O livro rebate alguns números. Na época, se dizia que Pelé era o jogador com maior média de gols com a camisa da Seleção. De Vaney, porém relaciona outros nove jogadores com média superior. Entre eles, Leônidas da Silva, Feitiço, Paulo Valentim, Silvio Pirilo, Quarentinha, entre outros. Pelé vinha em décimo, com 0,97 gols. Outro dado curioso. No levantamento de De Vaney, o Rei do Futebol deixou de marcar gols em 513 jogos.

No livro o autor contestava gols marcados po Pelé contra times amadores, como o da fábrica da Phillips e os gols marcados pelo time do exército.

De Vaney também se irritou profundamente com a recusa de Pelé de disputar a Copa de 1974, na Alemanha. Pelé foi o primeiro jogador brasileiro a se recusar a servir à Seleção. Depois, apareceu na Alemanha, durante a Copa, usando uma camisa com escudo de uma fábrica de refrigerantes.

Num dos parágrafos em que questiona os recordes de Pelé, De Vaney, em tom irônico, diz que ser o primeiro jogador que se negou a defender seu país em uma Copa do Mundo é um recorde genuíno de Pelé.

Apesar de todos os questionamentos, De Vaney jamais deixou de reconhecer a grande capacidade de Pelé, que considerava um craque acima da média. Conforme alega Álvaro, graças a seu pai o Peixe não trocou o então menino Gasolina (primeiro apelido de Atleta do Século) por um jogador do Jabaquara. O jornalista intercedeu e pediu à diretoria do Peixe que desse mais chances ao garoto.

Exemplares do livro só são encontrados com Álvaro Motta, filho de De Vaney.

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