sábado, 8 de maio de 2010

Quincas, ponta esquerda

Autor: Mário Lopomo

Nos inicio dos anos 1950, o Fluminense do Rio de Janeiro tinha um ponta-esquerda de nome Quincas. Acho que devia ser seu sobrenome. Ele formava na extrema esquerda, onde na outra ponta a direita tinha Telê.

Um dia o Fluminense veio jogar no Pacaembu contra o Corinthians e Micuim corinthiano roxo foi assistir junto a seu pai. A molecada que gostava de jogar bola sempre imitava um ídolo seu, e adotava o nome do jogador para ser seu nome futebolístico. Como Micuim gostava de jogar na ponta, tanto direita como na esquerda, pois tinha facilidade de chutar bem tanto com a direita como com o pé esquerdo. Com o direito batia na bola, a maciota de três dedos para fazer uma curvita, e com a esquerda chutava forte em linha reta, que mais parecia uma bomba.

Depois de voltar do jogo, todos imaginavam que ele ia adotar o nome do ponta direita Cláudio Cristóvão Pinho, o grande ídolo corintiano daquela época. Eis que de repente ele aparece no campo do Corintinha do Brooklin com o nome de Quincas, ponta esquerda do Fluminense. Gente a partir de hoje sou Quincas ponta esquerda.

Micuim era um driblador por excelência e todos ficavam indignados por ter o Corinthians, um ponta esquerda driblador chamado Mario e, ele dar preferência há um ponta sem expressão e, ainda mais, sendo do Rio de janeiro.

Com o passar do tempo é que nos percebemos que ele não passava de um gozador. Num jogo contra uns cabeças de bagres, ele pegou a bola e foi driblando, fazia dodeios e um baiano cismou de querer por toda lei tirar dele. Micuim o driblou de todas as formas, Gingou pra cá, pra lá, deu marcha ré. Deu uma caneta. Um chapéu, matou no peito e, quando ela rolou até a cocha, ele pegou a bola com as mãos e deu para o teimoso. Toma leva para casa. Pronto, foi uma tremenda gargalhada. Até os adversários riram. A vítima da gozação olhou com cara de espanto, e pelo movimento da boca, cujo som não saiu, a gente imaginou o que ele estava dizendo em sigilo. Na certa a mãe do Micuim, segundo seu pensamento, estava na zona.

Um dia fomos jogar na Vila Maria. Era 1960, o campo era numa baixada e dois lados do campo eram morros onde ficavam os torcedores. Num dos barrancos estava escrito “JÂNIO VEM AI”. A Vila Maria era um bairro de bravos, o mais temido da cidade de São Paulo. Bronca ali tinha que ficar entre eles, pois qualquer idiota que fosse meter a cara, saia torto de lá. O jogo começou e, eu dando botinada no meia-esquerda que estava me driblando. Só me manquei quando vi que o juiz tinha um revólver na cinta. Micuim ainda não tinha feito das suas e eu fui preveni-lo: - "Micuim o juiz está com um revólver na cinta eu vi, o cano é cromeado". Foi o mesmo que não dizer nada. Micuim não estava conseguindo dar seus dribles, coisa que todos gostavam de ver inclusive os adversários até mesmo no campo deles.

De repente o seu marcador dá uma bofetada na cara dele. Confusão no meio do salão. Digo, no meio do campo. O que foi pomba, disse eu ao agressor. Ele disse que eu sou um corno. Ânimos mais calmos, o juiz não fez uso do “cromeado” e o jogo continuou numa boa. Como Micuim estava sendo marcado em cima coisa que ele detestava, qui desequilibrar o cara, entre chamar o cara de viado, ele optou por corno.

Aí o jogo do Micuim começou a aparecer. O primeiro drible desconcertante se deu na linha lateral, perto da linha de fundo. Micuim vinha correndo com a bola quase presa nos pés e sentiu que um “cabeça de bagre” vinha a toda por trás. Ele deu um parado e o cara bateu com a cabeça no cabo da enxada que estava de pé na beira do campo. Ela tinha sido usada antes para fazer as linhas do campo.

Mais uma confusão, no “gramado” sem grama no meio do campo e perto do gol, só um pouquinha nas laterais. "Mais respeito", disse o afobado jogador que saiu fora da linha do campo. "Meu isso é futebol de arte", disse Micuim. O drible é normal no futebol. Até os adversários lhe deram razão, e Micuim foi aconselhado pelos diretores do Corintinha a maneirar, para evitar o pior.

No campo do Vila Prell, bairro de Santo Amaro, o riso foi total. Companheiros adversários o jogador e até mesmo Micuim, que era de pouco rir, caíram na gargalhada.

Micuim, depois de driblar dois adversários, foi com a bola em velocidade à beira da linha lateral, com um terceiro atrás dele. De repente a bola desapareceu. Não foi o Micuim que deu uma de mágico, a bola caiu num buraco do campo e ficou dentro. Micuim, que vinha na corrida com o adversário atrás, passou reto e ambos ficaram procurando a bola. Parece que as coisas aconteciam de propósito quando ele estava com a bola nos pés.

Quando o Marechal Floriano foi jogar contra o, Estrela do Ipiranga, no campo deste, Micuim foi lá para assistir. O Marechal venceu por 3 a 2, mesmo com 10 jogadores, pois o goleiro Bolivar tinha quebrado a clavícula, com um chute maldoso do centroavante, e quando o jogo terminou todos os jogadores do Marechal Floriano apanharam que nem cachorros. Muitos vieram a pé, pois o caminhão foi destruído a pedradas e os pneus furados. Micuim viu que esse negócio de jogar bola como ele gostava ia acabar em tragédia. Então parou com a brincadeira, e em pouco tempo perdeu a vontade de jogar.

Por onde será que anda um jogador de várzea, nome Marcos, conhecido no bairro como Micuim, mas que gostava de ser chamado de Quincas, nome que adotou do, ponta esquerda que jogava no Fluminense...
Colaboração: Alexandre Magno Barreto Berwanger

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