Linus Pauling

Único ganhador individual de dois Prêmios Nobel, Linus Pauling também revelou-se um homem compromissado com a paz e a evolução científica Augusto Echeverria* É no mínimo interessante começar a rever a vida de Linus Pauling fazendo uma pequena confrontaçâo entre suas idéias e as de John van Vleck (1899-1980). Este era um brilhante cientista das Universidades de Wisconsin e Harvard, filho e neto de professores de Matemática e Astronomia da Universidade de Wesleyan, com formação acadêmica in natura. "Eu nunca fiz uma contribuição para a Física que não pudesse ser obtida a partir de equações" tornou-se uma frase célebre de Vleck, pronunciada na década de 50. John Hasbrouck Camionete van Vleck, físico e matemático estadunidense, compartilhou o Nobel de Física de 1977 com Philip Anderson e Nevill Mott, pelos estudos teóricos fundamentais das estruturas eletrônicas dos sistemas magnéticos e desordenados. Propôs com sólida fundamentação matemática a Teoria dos Ligantes da ligação molecular e os estudos dos espectros de moléculas livres. Alguém tão intuitivo como foi Linus Pauling, filho de um farmacêutico do Missouri, e de uma personalidade dinâmica com preocupações humanitárias e científicas, manifestou-se com a seguinte réplica: "Eu nunca fiz uma contribuição que não viesse de uma nova idéia. Aí sim, eu procurava a equação que ajudasse a sustentá-la." Ativismo político Em 28 de fevereiro de 1901 nascia na cidade de Portland, estado de Oregon (EUA), um menino que viria a tornar-se, segundo a prestigiosa revista New Scientist, um dos maiores cientistas de todos os tempos: Linus Carl Pauling. Grande químico, humanitário, pensador e defensor respeitado das liberdades civis. Em abril de 1962, durante a gestão Kennedy, Pauling passou um dia inteiro do lado de fora da Casa Branca carregando um cartaz, em uma manifestação contra testes nucleares atmosféricos. No mesmo ano ele entregou às Nações Unidas um documento com mais de 11 mil assinaturas de cientistas do mundo contra os testes. Por essas e outras iniciativas políticas e sociais, Pauling recebeu o Prêmio Nobel da Paz daquele ano. A atração de Pauling pela Ciência começou aos 14 anos, quando recebeu de presente de um amigo um jogo de química de brinquedo. Foi o vislumbre de um grande futuro. Ele estudou nas high schools elementares e públicas nas cidades de Condon e Portland. Chegou à faculdade aos 16 anos (1917). Na Universidade de Oregon estudou Engenharia Química e concluiu o curso em 1922. Durante os anos de faculdade Pauling dedicou-se às análises quantitativas. Seus estudos já se direcionavam para o campo da estrutura molecular e para a natureza da ligação química. Dava ênfase a dois temas: como os átomos se ligam entre si? Como se formam as moléculas? Depois de formado, um colega o indicou para lecionar Química no California Institute of Technology (Caltech). Logo se percebeu entre os professores a sua excelência no assunto. Entre os anos de 1922 e 1925 trabalhou sob o comando dos professores Roscoe G. Dickinson e Richard C. Tolman. Foi quando começou a desenvolver a determinação experimental das estruturas de alguns cristais e o trabalho teórico sobre a natureza da ligação química. Casou-se em 1923 com Ava Helen Moleiro, sua grande companheira. Tiveram quatro filhos: Linus Carl Jr., Peter Jeffress, Linda Helen e Edward Crellin. Posteriormente, eles Ihes dariam treze netos. Relevância acadêmica Em 1925, Pauling recebeu o Ph.D. em Química, com menções na Física e na Matemática. Desde sua nomeação à equipe do Caltech (1925-1926), o professor Pauling tornou-se membro pesquisador. Daí por diante sua carreira acadêmica foi grandiosa. Entre 1926 e 1927, trabalhou por 15 meses em universidades européias com nomes como Sommerfeld, Schrodinger, e Bohr, físicos que exploravam as implicações da mecânica do quantum na estrutura atômica. Naquele novo e revolucionário campo, Pauling encontrou um conceito físico e matemático para suas próprias teorias a respeito da estrutura molecular e da sua correlação com propriedades e função químicas. Por meio de uma nova técnica experimental, chamada cristalografia de raios X, permitiu aos cientistas aprender sobre os tamanhos e as configurações dos átomos dentro das moléculas e dos cristais. Pauling leva esses conceitos para seus trabalhos nos Estados Unidos onde retorna ao Caltech como professor assistente de Química até 1931. Com a mecânica quântica começou a formular as generalizações a respeito dos arranjos atômicos nos cristais com a ligação iônica. Pauling, descobriu que em muitos casos o tipo de ligação – se iônica ou covalente – poderia ser determinado nas propriedades magnéticas de uma substância. Estabeleceu também uma escala de eletronegatividade dos elementos para o uso nas ligações de um caráter intermediário (sendo a ligação em parte iônica e em parte covalente). Segundo essa medida, quanto menor for a diferença de eletronegatividade entre dois átomos não-metálicos, mais eles se aproximam de uma ligação puramente covalente. Para explicar completamente essa relação, Pauling publica, em 1931, segundo ele, o seu mais importante artigo, apresentando dois novos conceitos. a Teoria da Ressonância e a Teoria da Hibridação. A ressonância é uma teoria segundo a qual os elétrons saltam entre duas ou mais posições entre os átomos numa rede de ligações; isso ocorre em estruturas como a do benzeno e da grafita. A hibridação (ou hibridização) explica as ligações nas moléculas onde a teoria do octeto não tem alcance. Tais elétrons estariam em posições favoráveis para a ligação, como nas moléculas do metano, do etileno e do acetileno. Finalmente, em 1939, Pauling publica seu principal livro, A Natureza da Ligação Química e a Estrutura das Moléculas e Cristais, que lhe renderia o Nobel de Química em 1954. O manuscrito original do livro está no Museu Ava Helen, na Universidade de Oregon, ao lado de muitos dos papéis de Pauling doados, pelo próprio cientista, em 1986. Ebarrão com a medicina Suas pesquisas e seus trabalhos, além da Química Inorgânica e da Química Orgânica, rumam para outras áreas como a metalurgia e a mineralogia. Na Medicina teórica e aplicada fez descobertas importantes sobre doenças genéticas, hematológicas, imunológicas, função e psiquiatria do cérebro, evolução molecular, terapia nutricional, tecnologia diagnóstica, epidemiologia estatística, biomedicina e medicina ortomolecular. São mais de mil artigos e livros como Química Gera/(1947), publicado em nove idiomas, e Guerra Nunca Mais (1958). Suas atividades como pensador e pacifista trouxeram problemas a Pauling, como a perda do emprego no Caltech e a cassação de seu passaporte pelo governo estadunidense. Os principais motivos foram os textos e palestras do cientista sobre o mau uso da energia nuclear e sobre os testes que eram realizados na atmosfera, bem como o uso da bomba atômica como ar-ma de guerra. Graças a pressões externas, principalmente da opinião pública, Pauling recebeu seu passaporte de volta. Pauling também se arriscou na área da saúde com o trabalho sobre o uso de megadoses de vitamina C como promessa de eficácia contra resfriados, gripes e outras doenças, incluindo certos tipos de câncer. O trabalho gerou um grande desconforto na comunidade médico-científica que alegava certa falta de cuidado por parte de Pauling na condução desses estudos e resultados, pois o fato científico somente pode ser aceito quando é repetido diversas vezes, sempre com os mesmos resultados. Para isso, seria necessário comparar grupos que usassem a vitamina C com grupos que recebessem placebo. Diferentes grupos de cientistas repetiram por muitas vezes e em diversos locais as experiências e não constataram em nenhum caso a eficácia do trabalho descrito pelo renomado químico. Linus Pauling deixou uma mensagem de luta e esperança registrados em seus artigos, livros e textos. Um ser humano que dedicou sua vida ao trabalho científico-humanitário mesmo expondo seu princípio ético, mas sem abalar os alicerces de uma grande obra de sete décadas de dedicação à Ciência e à humanidade. *Augusto Echeverria é Engenharia Químico, Professor, Pedagogo e Químico Industrial