sábado, 12 de julho de 2008

O Jornalista e o diploma

O diploma é fundamental, mas a mestiçagem pode enriquecer o Jornalismo
Há uma grande movimentação no âmbito da Fenaj, a Federação Nacional dos Jornalistas, e dos vários sindicatos de jornalistas do País, na defesa da obrigatoriedade do diploma superior para o exercício do Jornalismo, motivada por uma possível decisão em contrário do STF – Supremo Tribunal Federal, que julgará nas próximas semanas o Recurso Extraordinário de nº 511961, interposto pelo Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São Paulo e pelo Ministério Público Federal, nesta direção.
A obrigatoriedade do diploma foi inquestionavelmente, a meu ver, uma vitória dos jornalistas brasileiros na moralização da atividade profissional e mostrou-se fundamental na revitalização da imprensa.
Com obrigatoriedade ou não, tornou-se tão natural contratar profissionais tecnicamente preparados para a atividade que empresa que se leve a sério dificilmente hoje abriria suas comportas para a contratação de leigos, ainda que essa obrigatoriedade viesse a cair. Poderia até contratar um ou outro, mas isso seria sempre uma exceção, visto que o custo de treinar alguém é elevado e as empresas, pelo que delas conhecemos, não gostam de desperdiçar dinheiro. Se o mercado oferece mão de obra de boa qualidade e a um custo mais do que razoável, porque elas vão contratar pessoas despreparadas, que custariam a elas muito mais dinheiro em treinamento? Não tem lógica, embora esse risco até exista.
O diploma, reafirmo, moralizou o Jornalismo e a atividade profissional, mas não foi decisivo, nem eficaz, na arte de ensinar os milhares de profissionais que forma a pensar, a encontrar novos caminhos, a ousar, a revolucionar.
Jornalistas diplomados como eu têm uma boa base técnica, tem bons treinamentos, tem uma boa visão de ética, de diretrizes, às vezes até de negócio, de edição etc., mas não têm, com as raras e honrosas exceções que só justificam a regra, a capacidade de pensar o inusitado, de quebrar paradigmas, de propor mudanças nas regras aprendidas nos bancos escolares, de dizer não ao sim e sim ao não, enfim de muitas vezes desconstruir o clássico para construir o novo.
Não sei se é exatamente por isso que temos cada vez jornais, revistas, telejornais, sites, radiojornais mais iguais e menos surpreendentes, instigantes. Vemos as fórmulas se multiplicarem e se igualarem, com mudanças apenas cosméticas, sem ousadia para mexer no âmago do jornalismo, no modo de selecionar os conteúdos, na forma de entregá-lo ao público.
Um olhar externo, de quem não está “contaminado” pelo ambiente, pode ser decisivo na quebra de certos conceitos, de certas fórmulas, desde que se tenha coragem para isso. Por que não atrair para as equipes, com a moderação necessária, por exemplo, artistas plásticos, que poderiam dar contribuições fantásticas na expressividade das inúmeras plataformas, como fez um dia Amílcar de Castro, que revolucionou a imprensa brasileira a partir das linhas com que redesenhou o Jornal do Brasil, se a memória não me falha, nos anos 1950?
E músicos, quem sabe tentando entender o ritmo das palavras, das frases, enfim a musicalidade dos textos e diálogos?
Antropólogos? Eles não poderiam trazer contribuições impensadas para os mortais das letras com sua visão mais abrangente da sociedade, dos personagens do cotidiano, das celebridades tão perscrutadas por nossa mídia?
E por que não médicos, para acompanhar, na produção jornalística, os ritmos cardíacos, a pressão dos fechamentos, a pulsação dos diálogos, tentando ajudar os jornalistas a entenderem melhor a influência desse conturbado ambiente no produto final que vão entregar ao seu público.Advogados, meu Deus, poderiam ser fundamentais para serenar certos ânimos em matérias denuncistas, de modo a, sem perder a boa manchete, ajudar os jornais e os jornalistas a serem mais incisivos e menos espetaculosos.
Engenheiros e matemáticos não poderiam eventualmente ajudar a entender números, estatísticas e o palavrório oficial que muitas vezes chegam cheio de armadilhas nas redações, sem que os jornalistas se dêem conta disso?
E os filósofos? Não estaria faltando um pouco de filosofia na nossa cobertura jornalística, no entendimento do pensamento humano, de nossas fontes, de suas ações? Não estaríamos em condições de, ao pensar melhor toda a nossa produção, oferecer um produto de maior profundidade, um jornalismo mais refinado, crítico, consistente? Um toque de alguém com essa formação não poderia ajudar as equipes a entenderem melhor as razões existenciais de personagens bandidos, mitômanos, maníacos? Ah, essa poderia também ser uma contribuição trazida por psicólogos, psiquiatras.
Claro que todos esses profissionais têm hoje lugar garantido nos veículos quando são convidados a atuar como articulistas ou mesmo ao serem ouvidos como fontes especializadas. Mas não é disso que estou falando. Estou falando da mestiçagem no âmago da produção jornalística, nas entranhas das equipes, me refiro a pessoas que possam estar no dia-a-dia provocando desconforto, mexendo com as idéias e conceitos, buscando um olhar diferente dos acontecimentos, contribuindo enfim para que os jornalistas diplomados possam exercer sua atividade com mais talento e criatividade, sem perder o essencial que é a boa e qualificada informação. Mais do que isso, possam, além de escrever e editar, também pensar e refletir sobre o que estão fazendo. Criem condições de revolucionar permanentemente o Jornalismo, como ocorre com várias das outras atividades.
Defendo o diploma, mas já não sou tão radical assim na defesa da obrigatoriedade. Mas mais do que no diploma tento pensar no Jornalismo e em como ele seria ainda maior se conseguisse atrair para suas hostes alguns dos grandes talentos das várias áreas do conhecimento humano. Não se trata de abrir brechas para que essas pessoas venham roubar lugar de jornalista, mas sim de encontrar um caminho para que elas possam efetivamente se somar nesse gigantesco esforço do Jornalismo de bem informar a sociedade.
É um mero sonho, mas não deixo de sonhá-lo. Aliás, gosto de sonhá-lo.
Não sou, como sempre friso, dono da verdade. Gosto do desafio de ser sereno e tento sê-lo. Mas queria muito ouvir as opiniões dos leitores e confesso que muito me agradaria ver pensamentos, contra e a favor, do mesmo modo sereno, desapaixonado, quem sabe priorizando mais do que o coração (ou as convicções), a razão.
É também um belo desafio, e eu quero propô-lo a todos que tiveram a paciência de chegar até o final dessas tímidas reflexões.
*Eduardo Ribeiro é Jornalista formado pela Fundação Armando Álvares Penteado

Um comentário:

euclydeszamperetti fiori disse...

concordo plenamente o diploma dfá a pessoa o direito de; porém, em tds os setores encontramos profissionais conhecedores das mesmas que poderiam informar aos leitores e ñ o fazem, por ñ terem o diploma jornalistico.