quarta-feira, 12 de março de 2008

O apagão ético que assola o país

Manuel Carlos Chaparro * O XIS DA QUESTÃO - Na verdade, Paulinho e a sua Força Sindical não querem processar a Folha. O que eles querem mesmo é que os jornais se calem. Nessa atitude, e nesse pensar, se manifesta o "apagão ético" que assola o País: a ausência de motivações e razões Éticas no agir político, tanto no centro como nas periferias do governo. E quando assim é, e porque assim é, espezinham-se os princípios e valores que dão fundamento à República, nos quais está a instância da Ética. 1. O enterro da Ética Mais do que enojado com o perfil ético dos políticos brasileiros, entrei em estado de desesperança. Não é coisa boa, eu sei. Sei que perder a esperança em ideais e ideários é, de alguma forma, aceitar a renúncia à luta – no caso, a luta cidadã pela construção de uma sociedade Ética. Sem esperança, não há razões para lutar, qualquer que seja a luta. E aprendi isso com dom Helder Camara, quando dele ouvi a revelação do seu maior temor, o temor de que o povo perdesse a esperança. "Sem esperança não haverá luta nem razões para lutar", dizia ele. E para que a esperança não morresse, dom Helder juntava as pessoas. Com explicação igualmente sábia: - "Quando sonhamos sozinhos, é só um sonho; quando sonhamos juntos, é o início de uma nova realidade". Pelos sussurros que ouço das ruas, a descrença nos políticos espalha-se com velocidade de rastilho aceso. Não é para menos. Até o homem que nos prometeu uma revolução ética, aquele que, com essa e outras promessas, levou os nossos votos e as nossas esperanças, só agora nos deixa perceber que, na boca e no entendimento dele, Ética era apenas palavra sonora, boa de dizer. E melhor ainda enfeitar discursos eleitorais. Pelos vistos, e a julgar pelo que diz e faz, o homem não tem a mínima noção do que seja Ética. E isso faz mal ao Brasil. Porque de um presidente da República se esperariam bons conceitos, bons conselhos e bons exemplos. Mas, em matéria de Ética, o que temos visto e ouvido é o oposto do que esperávamos – tanto nos conceitos quanto nos conselhos e nos exemplos.Já não falo do mensalão, do qual o depositário das nossas esperanças jurou a pés juntos nada saber. Nem dos mensaleiros, que saíram do palácio, mas aos quais jamais faltaram afagos presidenciais. Freqüentemente, afagos públicos. Mas falo dos novos protagonistas em novos e sucessivos escândalos. Falo do escândalo dos cartões corporativos e do escândalo das ONGs favorecidas com verbas públicas por critérios partidários; falo desses nojentos jogos de poder onde tudo se troca entre os partidos e nos quais jamais entram os interesses da Nação; falo da política de trancas na porta depois da casa arrombada. Falo de frases que tudo desculpam, como as que inocentaram ministros que usaram dinheiro público para saborear tapiocas e fazer compras pessoais. E falo dos irados arroubos verborrágicos, nada republicanos e nada democráticos, que questionam o dever que a Constituição impõe ao Poder Judiciário, de zelar pelo cumprimento das leis - inclusive as eleitorais. Falo, também, de silêncios simbólicos, como aquele em que, para não pôr em risco uma conveniente aliança partidária (leia-se PDT), se ignoraram as recomendações da Comissão de Ética Pública da Presidência da República, no sentido de preservar a dignidade e a credibilidade da função de ser ministro (leia-se Ministério do Trabalho e ministro Carlos Lupi). Falo, por fim, das imprudências verbais que estimulam cerceamentos à liberdade de expressão e ao direito à informação. Como aquela do público apoio político dado à orquestração de ações impetradas por fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus, contra a Folha e a jornalista Elvira Lobato, campanha em que o objetivo era claramente o de amedrontar e inibir a ação jornalística, não a proteção de direitos ofendidos ou ameaçados. *Manuel Carlos Chaparro é jornalista, doutor em Ciências da Comunicação e professor livre-docente (aposentado) do Departamento de Jornalismo e Editoração, na Escola de Comunicações e Artes, da Universidade de São Paulo, onde continua a orientar teses. É também jornalista, desde 1957. Com trabalhos individuais de reportagem, foi quatro vezes distinguido no Prêmio Esso de Jornalismo. No percurso acadêmico, dedicou-se ao estudo do discurso jornalístico, em projetos de pesquisa sobre gêneros jornalísticos, teoria do acontecimento e ação das fontes. Tem quatro livros publicados, sobre jornalismo. O artigo foi publicado originalmente no site www.comunique-se.com.br

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