domingo, 5 de janeiro de 2014

"Tudo passará"

Nelson Ned

Os sete filhos de seu Nelson e dona Ned, sendo que o nome de todos começa com a sílaba ne (Nelson, Ned Helena, Nélia, Nedson, Neuma, Neyde e Nelci).

No fim da década de 1950, a mãe de Nelson Ned, dona Ned, havia passado no concurso da Coletoria Estadual de Minas Gerais e, para oferecer melhores condições aos filhos, sugeriu ao marido que a família se transferisse de Ubá, onde moravam, para a capital. Em Belo Horizonte, eles ficaram três anos, sempre morando de aluguel, nos fundos. Primeiramente na Rua Capivari, na Serra, e depois nas ruas Ceará e Gonçalves Dias, no Bairro Funcionários. A caçula da família, Nelci, nasceu em BH e foi na cidade também que Nelsinho arrumou seu primeiro emprego, para ajudar no sustento de casa. Com apenas 12 anos, ele começou a trabalhar como secretário do gerente da fábrica da Lacta, Mopyr de Souza Arruda, que o ajudou bastante, além de ser o pai da primeira paixão do futuro cantor, Eliciane, uma das inspirações para a famosa canção 'Tudo passará'.

A trajetória artística começava a deslanchar e Nelson passou a participar de programas da TV Itacolomi, como o 'Cirquinho do Bolão' e o 'Clube do Pererê', e a cantar nas rádios Guarani e Inconfidência. Questionado sobre suas lembranças de Belo Horizonte, o artista fica pensativo, mas logo diz: “Aldair Pinto, radialista da Inconfidência’’. Foi ele quem te lançou? E Nelson responde, categórico: “Não. Quem me lançou foi Deus”.

Os irmãos, que eram bem crianças – já que Nelsinho é o primogênito –, não têm muitas lembranças de BH, mas Nedson d’Ávila, de 63 anos, o único que vive em Minas, em Santa Luzia, se recorda dos passeios pelo Parque Municipal e no Centro da cidade. “Cheguei a morar em São Paulo, mas sempre quis voltar para cá. Acabei criando família aqui, mas não perco o contato com ninguém. Mesmo quando o Nelson estava no auge, ele sempre ligava para todos. Somos uma família muito unida, apesar de cada um estar num canto. As pessoas que convivem comigo sabem de quem sou irmão. Já me pediram até autógrafo”, brinca.

Outra imagem que está na memória de Nelson Ned em BH é um cachorro pastor-alemão com o qual passeava pelas ruas da capital, além de uma reportagem da revista O Cruzeiro, de 1963, a primeira de sua carreira.

Nelson Ned d’Ávila Pinto –Nelsinho para os íntimos e Nelson Ned para o mundo – nasceu em 2 de março de 1947, num casarão na Rua Coronel Júlio Soares, em Ubá, na Zona da Mata. A casa abriga hoje uma clínica de estética e pertenceu à família da mãe, dona Ned, durante muitos anos. Milton de Abreu d’Ávila, de 90 anos, tio de Nelson, “viajante aposentado e flautista amador”, como se intitula, tem uma memória prodigiosa e se lembra exatamente do dia do nascimento do cantor. “A casa ficou cheia. Os vizinhos foram todos para lá. Ele nasceu no quarto em que eu dormia com meu irmão. Nelsinho foi uma criança muito esperada, porque era o primeiro filho da minha irmã, o primeiro neto e o primeiro sobrinho. Ele nasceu de parto normal, deu tudo certo, nasceu um menino saudável”, relata.

Mas, como a criança não se desenvolvia, levaram-na ao médico e foi diagnosticada uma alteração genética de nome complicado: displasia espôndilo-epifisária. Os demais irmãos nasceram sem esse distúrbio, porém os três filhos de Nelson (Nelson Júnior, Monalisa e Verônica) herdaram a baixa estatura. “Mas ele sempre enfrentou e superou todos os obstáculos e minha irmã dizia uma coisa importante, que ia criar o filho para o mundo e não um mundo para o filho”, pontua o tio. A família, principalmente a materna, é toda musical. Dona Ned, a mãe, tocava piano, violão, acordeom e ainda estudou canto lírico; e o pai, seu Nelson, também gostava de soltar a voz. “Aprendi tudo com meus pais. Em todos os sentidos”, comenta Nelson Ned.

O tio Milton lembra que já com 3 anos o menino gostava de imitar os bichos e até mesmo o presidente Getúlio Vargas. “A gente o colocava em cima da mesa e falava para ele cantar. Sempre teve aquele vozeirão e tenho um orgulho danado do Nelsinho. Não conheço ninguém que tenha ido a tantos países como ele e tenha feito tanto sucesso. Ele sempre foi muito inteligente e alegre”, recorda.

Com 4 anos, Nelson participou do programa 'A hora do guri', na Rádio Educadora Trabalhista de Ubá e ganhou o 01º lugar. O mesmo palco onde ele se apresentou ainda está lá, no prédio da emissora, que completa 60 anos em janeiro. O presidente da Sociedade Musical e Cultural 22 de Maio, João Carlos Teixeira Mendes, que organizou homenagem ao filho ilustre de Ubá em julho, narra episódio curioso daquela época. “O dono da rádio, Xavier Pereira, o Xaxá, disse: ‘Nelson, o microfone é todo seu’. Ele foi lá, cantou e na hora de ir embora, sabe como é criança, queria levar o microfone de todo jeito para casa”, brinca.

Chuva de rosas
O tributo que mobilizou o município no meio do ano e contou com a presença de Nelson (que não ia à cidade havia 20 anos), da família e amigos teve direito a chuva de rosas, desfile em caminhão dos bombeiros e até a uma apresentação surpresa de seu Milton, que tocou na flauta doce para o sobrinho a canção 'Tudo passará'.  “Não sei quem chorou mais. Se fui eu ou ele”, emociona-se o tio.

Na ocasião, também foi inaugurado um espaço na sede da Sociedade 22 de Maio, com parte do acervo de Nelson Ned – a casa onde ele vivia em São Paulo pegou fogo e restou pouca coisa –, como troféus, prêmios, diplomas, comendas, títulos de cidadão honorário, discos de ouro e de platina. “A ideia é fazer um complexo cultural, que já tem até projeto, voltado para várias personalidades ubaenses, como o próprio Nelson, Ary Barroso e o ator Mauro Mendonça. O que houve em julho foi apenas o começo. Ubá devia isso ao Nelson Ned. Ele ficou muito feliz, se sentiu extremamente valorizado. É um fenômeno de talento e carisma que merece ser reconhecido”, opina João Carlos.

Sem cachê
João Carlos da Rocha Moreira, de 59 anos, motorista que ficou encarregado de levar e buscar Nelson durante os quatro dias em que ele ficou em Ubá, também reparou no quanto o artista estava emocionado com a homenagem. Quando foi buscá-lo no aeroporto de Juiz de Fora, o cantor estava sério e pouco falava, mas, à medida que foi adquirindo confiança, passou a contar causos. “No fim da viagem, quando foi se despedir, ele me cobrou cachê. Achou que eu era o empresário dele. E entrei na onda e disse que ia mandar o dinheiro para ele em São Paulo.”

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