quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Bauru-SP

BAURU, PELÉ E XUXA
Luiz Carlos Azenha*
Nasci em Bauru, interior do estado de São Paulo. Foi lá que Pelé cresceu e começou a jogar futebol. Em Bauru, metade dos homens adultos dizem que já jogaram com ele. Não foi meu caso, embora, como Pelé, eu chutasse com os dois pés.Torço pelo Santos FC por causa de Pelé. Vi o craque jogar em fim de carreira. Entrevistei o Pelé algumas vezes, em Nova York e em Roma. Mas a melhor lembrança que tenho dele foi da despedida em Bauru, quando Pelé voltou a vestir a camisa do Bauru Atlético Clube, o Baquinho, onde começou a carreira. No jogo, Pelé refez a jogada que poderia ter resultado no gol mais inteligente da carreira dele.
Foi na Copa do México, em 1970, contra o Uruguai. Mazurkiewski era o goleiro adversário. A jogada da Copa está no filme Pelé eterno, que vale pelo arquivo dos gols geniais que ele fez.Voltando ao lance da Copa, Pelé recebeu um passe na grande área, deixou a bola passar e confundiu o goleiro uruguaio. Foi buscar a bola do outro lado de Mazurkiewski. Infelizmente, concluiu a jogada chutando para fora.O resto todo mundo sabe: a Seleção Brasileira foi tricampeã mundial com o melhor time que o Brasil já formou. Felix, Carlos Alberto, Brito, Piazza e Everaldo (Marco Antônio); Clodoaldo, Gérson e Rivelino; Jairzinho, Tostão e Pelé. O gol perdido contra o Uruguai ficou entalado na garganta de Pelé.
Ele se desfez do fantasma ao se despedir do futebol em Bauru. O campo do BAC é acanhado. Ficou menor ainda, por causa da construção de piscinas.O pessoal da velha guarda conta que, no auge do clube, que abandonou o futebol, o BAC tinha um craque melhor que Pelé: Dondinho, o pai dele. O BAC foi campeão do Interior com os gols de cabeça de Dondinho, no início dos anos 50.
Nos anos 60, meu pai era um dos torcedores mais exaltados do BAC, quando o time ainda disputava campeonatos estaduais.Lembro-me de um dia em que, revoltado com a atuação do juiz, seo Azenha atirou pedaços de tijolo para dentro do campo, tentando acertar o safado. Quando Pelé foi a Bauru se despedir do futebol, vi o jogo da lateral de campo. Já era repórter. Ele recebeu a bola na entrada da área, deu o mesmo drible de corpo, e não desperdiçou. Deu a volta no goleiro e só empurrou a bola para dentro do gol vazio.A arquibancada só não desabou porque era de concreto.
Reencontrei Pelé anos depois, em Nova York, como jogador do Cosmos. Ele tinha uma turma de amigos na cidade. Comprou uma casa de veraneio nos Hampton's, uma praia chique de Long Island.As farras, dizem testemunhas, eram de tirar o fôlego. Lulu, o fotógrafo oficial de Pelé, e Omar Freire eram fiéis escudeiros do craque. Pelé era desconhecido dos americanos. O inglês dele era sofrível. Omar conheceu Pelé numa loja de eletrônicos, na rua 46, a então rua dos brasileiros (agora tem mais lojistas coreanos do que brasileiros). Pelé estava mal agasalhado para o inverno novaiorquino. Omar ofereceu uma carona numa Kombi, a mesma que usava como motorista-produtor da Revista Manchete. Pelé aceitou a carona e Omar entrou para o círculo de amigos.Nas festas de arromba, havia sempre duas mulheres para cada homem. No dia seguinte, muita gente reclamava com Pelé, dizendo que "não tinha se dado bem". Pelé lembrava que não tinha sido por falta de mulher. "O problema é que todas querem ficar com você", reclamavam os amigos.
Anos mais tarde, Pelé começou a namorar a apresentadora Xuxa, que iniciava carreira na tevê. Pelé encomendou fotos dela ao Lulu, profissional brilhantíssimo. Omar e o fotógrafo escolheram o cenário: um pier no Brooklyn, com linda vista para a ilha de Manhattan.Com a maior naturalidade, entre uma série de fotos e a seguinte, Xuxa entrava na Kombi e trocava de roupa. Ficava nua, diante do Omar. Nos Estados Unidos, Pelé era garoto-propaganda do grupo Time Warner.
Teve algumas idéias marotas, como a de se candidatar a presidente da República. Ainda bem que os compromissos comerciais dele nos livraram disso. Pelé sempre foi simpático com os jornalistas. Na Copa de 1990, na Itália, Pelé foi comentarista de várias emissoras estrangeiras. O centro de imprensa ficava em Roma, mas Pelé não passava por lá. Ia direto aos estádios. Eu trabalhava na Rede Manchete. Minha tarefa era gravar reportagens especiais em todo o país e retornar ao centro dos jornalistas, para cuidar da edição.Numa dessas ocasiões, começou a correria. Até os bombeiros italianos ficaram com medo de que se tratava de um incêndio ou desabamento. Descobriram que o problema era Pelé. Ele visitava o centro de imprensa e jornalistas do mundo inteiro se esmurravam para entrevistá-lo. Um fenômeno que até hoje se repete, onde quer que esteja o Rei.

Nenhum comentário: