quarta-feira, 30 de abril de 2008

Ser mineiro

Marcelo Scotton
Dia desses fiz uma viagem para fora do estado de Minas Gerais. Jocosamente, um natural de um estado vizinho bradou com potência: “olha o mineiro aí!”. E então começou uma série de insinuações ora debochadas, ora pejorativas a respeito desta instituição até então para mim desconhecida, sendo apenas um mero gentílico: o mineiro.Para o meu interlocutor, ser mineiro é ser hospitaleiro e ter na geladeira de casa 10 barras de queijo Minas, sejam elas embaladas ou prontas para o consumo. É apoiar irrestritamente o governador tucano Aécio Neves. É passar o dia inteiro, se não comendo, pensando em pão de queijo. É ter obrigatoriamente parentes no interior, sendo que estes vivem em casinhas humildes onde se serve café o dia inteiro. É estar sempre no afã de ter uma boa prosa. Daí, o meu susto: segundo as características postas à baila, sofro do mal da antítese: nasci em Minas, mas não sou mineiro.Mas afinal, o que é ser mineiro? Em que ponto Carlos Drummond de Andrade confunde-se com Newton Cardoso? Quais os traços de semelhança entre Marcos Valério e Fernando Sabino? Não, a instituição “o mineiro” não é algo assim tão uniforme, pronto para espalhar a experiência hospitaleira aos corações e mentes estrangeiros, nem para disseminar o hábito de se fartar de pinga com torresmo mundo afora. Certamente sou um mineiro muito diferente de Ziraldo, o cartunista: sou veementemente contra as pensões milionárias ofertadas às “vítimas” da ditadura militar.Não existe um traço comum algum a um determinado povo? Pelo contrário. Se fosse diferente, não seríamos uma nação - e aí, estamos falando de Brasil - tão avacalhada. O que me ocorre é que soa certo ridículo apregoar certos rótulos. As semelhanças são culturais e não genéticas ou de qualquer outro gênero. Afinal, será que se um bebê mineiro for criado na Índia, quando ele crescer vai abrir uma casa de pão de queijo por lá? Improvável. Então, não posso dar razão ao que dizem aqui em Belo Horizonte: “mineiros dirigem mal”. Desde quando a habilidade no volante tem a ver com o fato de onde nós nascemos? Desde quando isso é cultura e não perícia? Em que ponto da história nós desenvolvemos a imperícia na direção como um traço marcante de personalidade?Minas são muitas. É do tamanho dos rótulos que suas diversas regiões irão agregar. É de Newton Cardoso e também de Carlos Drummond de Andrade.

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